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Carbonatação do concreto e o teste de ensaio com fenolftaleína

Se você trabalha com construção ou simplesmente vive em um prédio, há um processo químico invisível, lento e implacável que está silenciosamente desfazendo a proteção das armaduras de aço em suas estruturas. Este processo é a carbonatação do concreto.

Carbonatação do concreto e o teste de ensaio com fenolftaleína

Muitos engenheiros e proprietários só se dão conta de sua gravidade quando já é tarde demais: quando as fissuras aparecem e o concreto começa a se destacar, revelando o aço corroído. A carbonatação é o precursor do "câncer" estrutural e ignora-la significa colocar em risco a durabilidade, segurança e o valor de mercado de qualquer edificação.

Neste artigo, vamos desvendar não apenas a definição exata desse fenômeno, mas, mais importante, seus impactos catastróficos e como a engenharia moderna faz o diagnóstico preciso. Prepare-se para entender por que um simples teste de fenolftaleína pode ser o fator decisivo entre uma estrutura que dura séculos e uma que exige reparos caros e urgentes em poucos anos.

O que é como ocorre a carbonatação do concreto


O dióxido de carbono está presente em todos os lugares, como no ar que respiramos e até na água que consumimos. Além de ser responsável pelo gás das bebidas e por ajudar no crescimento das massas, ele também pode penetrar na superfície do concreto e se dissolver na água existente em seus poros, originando o ácido carbônico.

As reações químicas que resultam na formação de carbonatos promovem o armazenamento permanente desse CO₂. O processo de carbonatação acontece das partes externas do concreto, em contato com o CO₂ do ambiente, em direção ao seu interior, conforme mostrado na figura abaixo:

Carbonatação a partir de uma superfície de uma estrutura de concreto exposta ao CO₂
Carbonatação a partir de uma superfície de uma estrutura de concreto exposta ao CO₂

O ácido carbônico que se forma nos poros do concreto reage com o hidróxido de cálcio, um produto benéfico da hidratação do cimento, pois contribui para o fortalecimento da matriz do material, resultando na formação de carbonato de cálcio. Durante a carbonatação, as reações químicas consomem o hidróxido de cálcio e produzem carbonato de cálcio, substituindo moléculas relativamente grandes por outras menores.

Essa transformação provoca uma redução gradual do pH do concreto, iniciando-se nas camadas mais externas e passando de cerca de 13 para valores entre 8 e 9. Em estruturas de concreto armado, essa queda de pH pode comprometer a camada de proteção da armadura de aço, favorecendo o início do processo de corrosão quando há presença de umidade e oxigênio.

Como consequência, podem ocorrer o desplacamento da superfície do concreto e a diminuição de sua resistência mecânica. Para prevenir a corrosão da armadura, as normas de projeto recomendam um cobrimento mínimo de concreto, geralmente acima de 30 mm, e o uso de concreto de alta resistência, que apresenta menor porosidade. Um exemplo dessa situação é mostrado na figura abaixo:

carbonatação reduz o valor do pH do concreto
A carbonatação reduz o valor do pH do concreto. Um pH elevado é necessário para proteger a armadura contra a corrosão. Isso pode ser resolvido projetando-se o concreto com alta resistência e uma camada de recobrimento, geralmente de 30 mm ou mais.

Apesar disso, a carbonatação também pode aumentar a resistência do concreto tanto à compressão quanto à tração, mesmo sem a presença de armaduras de aço. Esse fenômeno pode ser aproveitado, por exemplo, para melhorar as propriedades mecânicas do concreto britado quando ele é reutilizado como agregado reciclado em pavimentações e fundações, desde que o material seja submetido à carbonatação.

Esse processo pode ser intensificado ao armazenar o concreto britado de forma que suas superfícies fiquem mais expostas possível ao CO₂ / ar durante todo o período de armazenamento e uso.

A mistura de frações grossas e finas no concreto britado leva ao empacotamento das partículas e impede a circulação de ar, assim como camadas de cobertura densas. O manuseio e o armazenamento do concreto britado para a absorção de CO₂ são fatores importantes para maximizar o sequestro de CO₂. Um exemplo disso é mostrado nas figuras abaixo:

Tamanho das partículas do concreto

Onde vemos na primeira imagem uma ampla variedade de tamanhos de partículas de concreto triturado resulta em uma estrutura de empacotamento compacta com movimentação de ar limitada.

Já na segunda imagem vemos uma gama reduzida de tamanhos de concreto britado que permite uma compactação menos eficiente e, consequentemente, facilita a movimentação de ar e CO₂ pela estrutura, aumentando a taxa de carbonatação. Alternativamente, a mistura periódica das partículas também pode expor suas superfícies ao CO₂, facilitando a carbonatação.

Fatores que afetam a taxa de carbonatação


A carbonatação tem início na superfície do concreto e avança gradualmente para o interior, geralmente a uma taxa aproximada de 0,039 polegadas por ano em concretos de alta qualidade com baixa relação água/cimento.

Para que o processo avance até a fase de bicarbonatação, na qual as reações continuam a se propagar em maiores profundidades, é necessária uma maior concentração de dióxido de carbono nessas regiões internas.

O CO₂ adicional pode penetrar mais profundamente no concreto por meio de fissuras, que funcionam como canais de transporte para gases, água e outros agentes contaminantes. Uma relação água/cimento elevada também favorece a ocorrência da bicarbonatação, o que acaba resultando em um concreto mais poroso, frágil e com menor resistência.

Além de se formar no interior da matriz, o carbonato de cálcio também pode surgir na superfície, criando uma camada externa esbranquiçada e quebradiça quando aquecedores a combustíveis fósseis são utilizados de maneira inadequada durante a concretagem em climas frios.

O dióxido de carbono liberado por esses aquecedores reage com o hidróxido de cálcio presente na superfície do concreto, originando esse depósito de carbonato de cálcio. Essa camada envolve as partículas de cimento ainda em estado plástico ou semiplástico, dificultando a continuidade do processo de hidratação.

Para evitar a formação dessa película superficial frágil e seus efeitos negativos nos elementos pré-moldados, recomenda-se não utilizar aquecedores para cura acelerada antes da pega inicial do concreto.

A presença de água também é essencial para a carbonatação. O ambiente ideal para que essas reações ocorram é aquele com umidade relativa entre 50% e 70%. Em concretos com umidade inferior a 40%, há água insuficiente para dissolver o CO₂, tornando o processo menos provável. Já em umidade superior a 90%, os poros permanecem saturados, impedindo a penetração e difusão do ácido carbônico, o que novamente bloqueia a carbonatação.

Compreendendo a redução do pH induzida pela carbonatação


O principal impacto da carbonatação no concreto é a redução de sua durabilidade, provocada diretamente pela diminuição do pH. Para compreender esse fenômeno, é necessário entender que o pH, termo de origem alemã que significa “potencial hidrogeniônico”, indica a concentração de íons de hidrogênio presentes em uma solução aquosa.

A escala de pH varia de 0 a 14, sendo que valores próximos de 0 representam substâncias fortemente ácidas (como o ácido de bateria) e valores próximos de 14 indicam substâncias altamente alcalinas (como o hidróxido de sódio, ou soda cáustica). A água pura, por sua vez, é considerada neutra, com pH igual a 7.

O hidróxido de cálcio, uma das principais fontes de resistência na matriz do concreto, contém dois íons de hidrogênio, enquanto o carbonato de cálcio não possui nenhum. Quando parte do hidróxido de cálcio é consumida durante a carbonatação e substituída por carbonato de cálcio, a concentração de íons de hidrogênio na matriz diminui, o que resulta em uma queda no pH.

Essa redução é especialmente crítica em estruturas de concreto armado, pois o ambiente altamente alcalino do concreto, normalmente com pH acima de 12, forma uma camada passivante de óxido ao redor das armaduras de aço, protegendo-as contra a corrosão.

A carbonatação, entretanto, pode reduzir o pH para valores inferiores a 9, o que enfraquece ou até remove completamente essa camada protetora, deixando o aço vulnerável à corrosão.

Vale também destacar que a escala de pH é logarítmica, ou seja, cada unidade representa uma variação de dez vezes na concentração de íons de hidrogênio. Assim, uma redução de cinco pontos, por exemplo, de pH 13 para pH 8 após a bicarbonatação, o que corresponde a uma diminuição de 100.000 vezes na alcalinidade do concreto.

Teste de carbonatação com fenolftaleína e a NBR 13528:2018


A NBR 13528:2018 fala sobre os ensaios de carbonatação que geralmente requerem a retirada de um corpo de prova ou o corte de uma amostra de concreto. Na maior parte das vezes, aplica-se uma solução de fenolftaleína na superfície recém-fraturada dessa amostra para identificar tanto a presença quanto a profundidade da carbonatação.

Teste de carbonatação com fenolftaleína e a NBR 13528:2018
Teste de carbonatação com fenolftaleína e a NBR 13528:2018

Quando a solução de fenolftaleína é aplicada sobre o concreto, a coloração resultante indica o nível de pH. Se o concreto permanecer com a cor original ou adquirir um tom fúcsia, isso reflete o grau de alcalinidade do material. A tonalidade fúcsia surge apenas quando o pH é superior a 9,5, o que significa que há pouca ou nenhuma carbonatação.

Um fúcsia intenso e imediato indica um pH bem acima de 9,5, enquanto uma coloração mais suave e de aparecimento gradual aponta para valores próximos desse limite. Se o pH cair abaixo de 9,5, sinal de carbonatação avançada, não ocorre mudança perceptível de cor.

A profundidade da carbonatação é medida após a aplicação da fenolftaleína na superfície fraturada. Em uma amostra típica, a parte externa do concreto não apresentará coloração, evidenciando a zona carbonatada, enquanto o interior exibirá o tom fúcsia característico. O limite entre as duas regiões pode aparecer com uma tonalidade rosada mais clara, e o núcleo do concreto mostrará uma cor mais viva. A determinação da profundidade da carbonatação é feita medindo-se a distância da borda externa até o ponto onde o concreto começa a apresentar a coloração fúcsia.

Quando há suspeita de que outros fatores além do dióxido de carbono, como uma cura inadequada, estejam contribuindo para o processo de carbonatação, podem ser aplicados métodos complementares de análise.

Nesse caso, se pode fazer também o exame petrográfico da amostra que pode incluir diferentes testes de coloração por reação ácida, observações microscópicas e, possivelmente, análises por difração de raios X.

Resistência à carbonatação e seus efeitos


Para evitar a carbonatação, é importante lembrar que esse processo ocorre com maior frequência em concretos que apresentam alta relação água/cimento, elevado teor de água, baixo teor de cimento ou que passaram por um período de cura curto ou realizado de forma inadequada.

Concretos que incorporam grandes quantidades de materiais cimentícios suplementares, como cinzas volantes ou escória, também podem apresentar uma taxa de carbonatação superior à de concretos com a mesma relação água/cimento (a/c) produzidos apenas com cimento Portland. Em geral, esses materiais fazem com que o ganho de resistência ocorra mais lentamente, exigindo, portanto, um tempo de cura maior para garantir proteção adequada contra a carbonatação.

Além disso, concretos muito permeáveis, geralmente devido à presença de fissuras ou excesso de porosidade, são mais propensos à carbonatação. Quando essa ocorre, a velocidade do processo em concretos de baixa qualidade é superior à observada em concretos densos e bem curados.

Nos concretos armados, a presença de carbonatação aumenta significativamente o risco de corrosão das armaduras. Uma forma eficaz de reduzir esse risco é aumentar a espessura da camada de concreto que recobre o aço, pois isso prolonga o tempo necessário para que a carbonatação atinja a profundidade das barras metálicas.

Referências


  • Neville, A. M. (2015). Propriedades do Concreto - 5ª Edição. Brasil: Bookman Editora.
  • https://www.concrete.org.uk/fingertips/carbonation-of-concrete/ ( acessado em 10/11/2025 as 18:37)
  • https://www.ivl.se/projekt/co2-concrete-uptake/carbonation-of-concrete.html ( acessado em 10/11/2025 as 18:53)
  • https://precast.org/blog/understanding-carbonation/ ( acessado em 10/11/2025 as 18:59)
  • https://www.molins.es/construction-solutions/en/concrete-repair-and-protection/what-is-concrete-carbonation/ ( acessado em 10/11/2025 as 19:30)
  • https://ascelibrary.org/doi/10.1061/JMCEE7.MTENG-16222 ( acessado em 12/11/2025 as 19:38)

Sobre o autor


Pedro Coelho Olá meu nome é , eu sou engenheiro químico com Pós Graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho e também sou Green Belt em Lean Six Sigma. Além disso, eu conclui recentemente o curso de Engenharia Civil, e em parte de minhas horas vagas me dedico a escrever artigos aqui no ENGQUIMICASANTOSSP, para ajudar estudantes de Engenharia Química e de áreas correlatas. Se você está curtindo essa postagem, siga-nos através de nossas paginas nas redes sociais e compartilhe com seus amigos para eles curtirem também :)

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