A indústria da moda, com sua capacidade de ditar tendências e impulsionar a economia global, esconde uma face preocupante: ela é uma das maiores vilãs ambientais do planeta. Longe do glamour das passarelas, a produção têxtil em massa gera montanhas de resíduos, contamina rios e libera toneladas de gases poluentes na atmosfera. Mas quais são os verdadeiros custos ambientais por trás de cada peça de roupa que vestimos? E, mais importante, o que podemos fazer para reverter esse cenário devastador?
Neste artigo, vamos desvendar os impactos alarmantes da poluição causada pela indústria têxtil, desde a deposição desenfreada de resíduos em aterros sanitários e desertos, passando pela contaminação do ar por emissões industriais e o uso de matéria-prima insustentável, até a poluição massiva da água por produtos químicos e microplásticos.
Além disso, vamos explorar as leis brasileiras que buscam regulamentar essa indústria e, crucialmente, apresentar soluções e medidas de mitigação que podem guiar o setor em direção a um futuro mais sustentável. Prepare-se para uma imersão profunda nos desafios e nas esperanças de um dos setores mais impactantes da nossa sociedade.
Impactos Ambientais da Industria Têxtil pelo Mundo
De acordo com o Parlamento Europeu, a indústria têxtil é uma das grandes responsáveis pelas emissões de gases do efeito estufa, pela poluição das aguas, e pela grande deposição de resíduos têxteis em aterros.
Esse tópico do artigo é focado em três pilares críticos: a deposição massiva de resíduos em aterros, que transformam paisagens em verdadeiros lixões de tecido; a poluição do ar, com emissões que contribuem para o aquecimento global e afetam a saúde humana; e a contaminação da água, um recurso vital, por produtos químicos tóxicos e microplásticos.
Deposição de resíduos têxteis em aterros
Tendo como base os dados da União Europeia (UE) ao qual peguei como base na minha pesquisa, cerca de 87% das roupas que viraram lixo têxtil acabam em aterros sanitários ou são incineradas, enquanto 30% das roupas que são produzidas em excesso acabam sendo descartadas sem ao menos terem sido usadas uma vez.
Além disso, os países ricos como Reino Unido gostam de fazer supostas “doações” de roupas para países emergentes como Chile, sendo que no final boa parte dessas doações acabam indo para o deserto do Atacama, pois boa parte dessa roupa é resíduo têxtil, e atualmente existe montanhas com toneladas de resíduos têxteis no deserto do Atacama por causa desse tipo de prática.
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Roupas usadas descartadas no Deserto do Atacama, em Alto Hospicio, Iquique, Chile |
Existem também países ricos que gostam de “vender” roupas que são praticamente resíduos têxteis para países africanos por um preço bem baixo, e isso chegou a se tornar um problema sério em Acra (Capital de Gana), onde boa parte dessa roupa que não dá para ser usada acaba se tornando lixo que chega as praias ou aterro sanitário da cidade.
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Enorme pilha de resíduo têxtil em Gana |
Poluição do Ar causado pela indústria têxtil
A indústria têxtil é responsável por cerca de 10% das emissões globais anuais de carbono, sendo uma das principais responsáveis pelo desmatamento e degradação do solo.
Um grande exemplo disso aqui no Brasil é que geralmente nós vemos nas manchetes dos jornais que o desmatamento da floresta amazônica está ligado “apenas” a agricultura e a pecuária. No entanto, isso não é 100 % verdade, pois boa parte do coro dos matadores de gado é vendido para indústrias têxteis.
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A indústria têxtil também polui o ar |
Além disso, a indústria têxtil também polui o ar através do uso equipamentos como caldeiras e geradores a diesel, que produzem gases poluentes que acabam sendo liberados para a atmosfera e afetam a população que vive próxima da indústria.
Dentre os poluentes gerados pelas indústrias têxtis estão o material particulado em suspensão (MPS), gás dióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, etc.
Poluição da água causada pela indústria têxtil
De acordo com o Serviço de Estudo do Parlamento Europeu, a indústria têxtil consome cerca 1,5 trilhão de litros de água anualmente. Essa indústria também polui 20 % da água limpa do planeta com os produtos químicos que são usados no beneficiamento do tecido, e com uso de pesticida no cultivo da matéria prima que é utilizada no processo produto.
Além disso, não devemos nos esquecer dos plásticos utilizados na produção das fibras sintéticas, que acabam indo para o oceano, e contaminam toda a cadeia alimentar com microplástico, que são partículas minúsculas de plástico que podem ser prejudiciais ao meio ambiente e à saúde animal.
No entanto, os cientistas ainda não sabem o quanto isso pode ser prejudicial, sendo que ainda mais pesquisas precisam ser feitas para se saber os riscos gerais do acúmulo de microplásticos nos organismos vivos.
A lavagem de roupa libera cerca de 0,5 milhão de toneladas de microfibras no oceano por ano, sendo que boa parte dos tratamentos de água convencionais não são eficientes para remover esse contaminante da água, pois os mesmos não foram desenvolvidos para remoção de micropartículas de plástico.
Leis, decretos ou resoluções nacionais que norteiam os impactos ambientais causados pela indústria têxtil aqui no Brasil
Primeiramente, antes de se pedir uma licença prévia para a construção de uma indústria têxtil, devemos nos remeter a Lei Federal nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que fala da Política Nacional do Meio Ambiente e atua estabelecendo como um de seus instrumentos o licenciamento e a revisão de atividades que são consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, que podem degradar ao meio ambiente.
Ainda na Licença Prévia, quando o projeto da empresa têxtil tem um grande potencial de causar sérios impactos ao meio ambiente, nos remetemos a Lei Federal n° 6.938 de 1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) que fala sobre o EIA/RIMA, que acabou se tornando uma exigência dos órgãos ambientais brasileiros a partir da Resolução n° 001 de 23/01/1986 da CONAMA
O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) são documentos técnicos multidisciplinares que tem basicamente como objetivo
Realizar uma ampla avaliação referentes aos impactos ambientais significativos e indicar as medidas mitigadoras correspondentes.
Leis referentes a deposição de resíduos têxteis
Em relação a geração de resíduos têxteis, a Lei Federal 12.305/2010 estabelece a responsabilidade compartilhada dos geradores de resíduos com os: fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, e os cidadãos e titulares de serviços de manejo dos resíduos sólidos urbanos na Logística Reversa dos resíduos e embalagens pré e pós-consumo. O intuito dessa lei é minimizar ao máximo a geração de resíduos e reduzir os impactos a vida humana e ao meio ambiente
Além disso, os produtos têxteis ainda não comtemplados por essa Lei, mas a geração de outros resíduos na indústria textil como por exemplo pilhas e pneus são comtemplados, logo a indústria têxtil também se torna corresponsável pelo descarte adequado desses itens.
A resolução Conama nº 313/2002 atua implementando no Brasil o inventário nacional de resíduos sólidos. Essa resolução através dos órgãos ambientais estaduais tem como objetivo coletar e fazer a organização de dados referentes a gestão de resíduos de uma empresa ao quantificar e diagnosticar informações sobre a geração, características, armazenamento, transporte, tratamento, reutilização, reciclagem, recuperação e disposição final dos resíduos gerados.
Essa resolução é uma poderosa ferramenta para que o Estado tenha o conhecimento da situação real em que se encontra o gerenciamento dos resíduos industriais de todos tipos de indústria no país, e por causa dessa resolução a indústria têxtil também é obrigada a preencher e enviar o formulário com informações sobre a geração de resíduos a cada 24 meses para o órgão ambiental de seu estado.
A norma NBR 10.004 de 2004 da ABNT na indústria têxtil é usada para fazer classificação dos resíduos sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e a saúde do homem. Essa verificação é feita basicamente para ver se o resíduo é perigoso ou não, e caso não seja perigoso, o mesmo pode até ser reaproveitado em algum outro processo como uma espécie de subproduto.
Leis referentes a poluição do ar
Em relação aos sérios problemas que ocorreram graças a indústria têxtil e as demais industrias com poluição do ar na década de 1970, foi feita uma organização da área de zoneamento industrial que começou após a aprovação do Decreto-Lei nº 1.413/1975, e da Lei nº 6.803/1980 de zoneamento industrial.
Essa lei de 1980 estabeleceu regras para a localização de áreas industriais e as limitações de uso em seus entornos, mas ela ainda não tratava especificamente de limites de emissão. Essa lei também vale para a indústria têxtil, pois ela trabalha com equipamentos como caldeiras e geradores a diesel, que produzem gases poluentes que acabam sendo liberados para a atmosfera e afetam a população que vive próxima em seu entorno.
Após a aprovação da lei de zoneamento industrial, foi aprovada uma lei que fixa os parâmetros para a emissão de poluentes gasosos e materiais particulados por fontes fixas, sendo essa lei a Resolução CONAMA nº 005/1989, que instituiu o Programa Nacional de Controle da Qualidade do Ar (PRONAR).
O PRONAR tem como objetivo limitar, à nível nacional, a quantidade de poluentes a serem lançados por fontes poluidoras para a atmosfera, e com isso promover uma melhoria na qualidade do ar.
As Resoluções CONAMA nº 003/1990 e nº 008/1990 complementam o PRONAR estabelecendo limites para a concentração de determinados poluentes no ar, sendo esses limites baseados em normas (ou recomendações) da Organização Mundial da Saúde, que é uma agência subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU) que leva em conta os limites de concentração de poluentes compatíveis com a saúde e bem-estar humano.
As resoluções nº 003/1990 e nº 008/1990 estabelecem limites de concentrações máximas para: partículas de material totais em suspensão; fumaça (composta principalmente de dióxido de carbono – CO2); partículas inaláveis; dióxido de enxofre; monóxido de carbono (CO); ozônio e dióxido de nitrogênio. Em 2006, a resolução nº 3824 do CONAMA foi aprovada para atualizar os dados do PRONAR que já estavam defasados em relação aos limites de emissão de cada tipo de fonte de combustível utilizado.
Leis referentes ao consumo de água
Quando se fala em consumo de água, a Lei nº 9.433/1997 fala sobre assegurar a disponibilidade de agua para gerações futuras, estabelecendo a outorga e a cobrança pelo uso racional e consciente da água, sendo isso algo que a empresa têxtil também é obrigada a cumprir com rigor.
Além disso, também temos a resolução Conama n°357/2005 que estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes pelas indústrias, logo para seguir essa lei, os efluentes da indústria têxtil devem estar de acordo com as condições e padrões de emissão adotado para o controle de lançamento de efluente no corpo receptor.
Em relação ao problema dos microplásticos da indústria textil tem um projeto de Lei n°6528 de 2016 do Deputado Federal Mario Heringer, que tem como objetivo proibir a manipulação, a fabricação, a importação e a comercialização, em todo o território nacional, de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumaria que contenham a adição intencional de microesferas de plástico, e dá outras providências.
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Resíduos têxteis de microplástico |
Além disso, também tem outro projeto de lei semelhante no estado de São Paulo do Ex- Deputado Estadual Chico Sardelli, mas ambos ainda não se tornaram lei para diminuir este impacto da poluição que os microplásticos causam ao meio ambiente.
No entanto, a medida que os estudos referentes aos microplásticos começarem a ter mais relevância mundial, esses projetos de lei podem até ser aprimorados e aprovados mais para frente.
Medidas de prevenção ou mitigação dos impactos ambientais
Primeiramente, visando a otimização do processo de uma indústria têxtil, nós devemos nos voltar primeiramente para procedência da nossa prima, e vê o quanto o processo de produção dessa matéria afeta ao meio ambiente.
Devemos verificar a procedência do algodão, das fibras duras, da lã, e do couro, usado em nosso processo produção. Caso esses materiais tenham uma “procedência duvidosa”, nós devemos procurar fornecedores que tenham um processo mais sustentável que afete menos o meio ambiente.
Observando também a questão da geração de resíduos, devemos ver a possibilidade da reciclagem do resíduo têxtil ao invés de descarta-lo em aterro sanitário. Existem duas maneiras de se reciclar os tecidos: a mecânica e a química.
O processo mais comum de reciclagem é o processo mecânico que envolve a picotagem do tecido. Os equipamentos usados para rasgar e triturar, são capazes de retalhar de 50 a 3 mil quilos de tecido por hora. Além disso, as fibras trituradas são transformadas em fardos e usadas pelas indústrias para produzir enchimentos para sofás, sacos de boxe, edredons, carpetes e outros produtos.
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Tecidos recortados para o processo de reciclagem |
Na questão da poluição do ar, podemos optar biomassa ao invés de lenha, pois ela vai gerar menos gases do efeito estufa, sendo que se a empresa usa diesel, logo também podemos substituir ele por biodiesel que é bem mais sustentável. Além disso, a indústria têxtil também pode instalar painéis solares, visando tornar o processo mais sustentável, reduzindo os seus custos com energia elétrica.
Já a questão da poluição da água envolve desenvolver um processo que demande um uso menor de produtos nocivos ao meio ambiente, e também buscar desenvolver roupas que liberem menos microplásticos na água.
Referências
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- https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/ATAG/2020/656296/EPRS_ATA(2020)656296_EN.pdf (acessado em 20/11/2022 as 19:29)
- https://www.greenofchange.com/textile-pollution (acessado em 20/11/2022 as 19:34)
- https://www.eea.europa.eu/publications/textiles-in-europes-circular-economy/textiles-in-europe-s-circular-economy (acessado em 20/11/2022 as 19:47)
- https://education.nationalgeographic.org/resource/microplastics (acessado em 30/11/2022 as 20:11)
- https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0921800921003050 (acessado em 30/11/2022 as 20:27)
- https://timesofindia.indiatimes.com/life-style/fashion/buzz/chiles-desert-dumping-ground-for-fast-fashion-leftovers/articleshow/87664613.cms (acessado em 30/11/2022 as 21:15)
- https://www.insideedition.com/mountains-of-old-donated-clothes-consumes-beautiful-beach-in-ghana-69935 (acessado em 30/11/2022 as 21:23)
- https://www.fibre2fashion.com/industry-article/6262/various-pollutants-released-into-environmentby-textile-industry#:~:text=Air%20pollution%20caused%20by%20the,oxide%20of%20nitrogen%20gas%2C%20etc. (acessado em 30/11/2022 as 21:38)
- https://www.sustainably-chic.com/blog/how-the-fashion-industry-contributes-to-deforestation#:~:text=Clothing%20made%20from%20decimated%20ancient,circle%20our%20planet%20seven%20times. (acessado em 30/11/2022 as 21:43)
- https://www.reciclasampa.com.br/artigo/saiba-tudo-sobre-a-reciclagem-de-residuos-texteis-no-brasil (acessado em 02/12/2022 as 22:14)
- https://forumdesustentabilidade.com.br/uso-da-biomassa-e-alternativa-renovavel-na-geracao-de-vapor-para-a-industria/ (acessado em 02/12/2022 as 22:27)
- https://meetyourwardrobe.com/the-textile-industry-and-environmental-pollution/ (acessado em 19/07/2022 as 23:25)
- https://edition.cnn.com/style/article/dyeing-pollution-fashion-intl-hnk-dst-sept (acessado em 20/07/2022 as 00:15)
- https://indiantextilejournal.com/pollution-board-to-set-new-norms-for-textile-industry/ (acessado em 20/07/2022 as 00:35)
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